domingo, 20 de fevereiro de 2011

“BOATE EVANGÉLICA, CERVEJA SEM ÁLCOOL...” – NÃO É O MUNDO NA IGREJA?



----- Original Message -----
From: “BOATE EVANGÉLICA, CERVEJA SEM ÁLCOOL...” – Não é o mundo na igreja?
To: contato@caiofabio.com
Sent: Friday, June 10, 2005 5:00 PM
Subject: Socorro - Será que sou mais um "evangélico"?


Querido Pastor Caio Fábio,

Graça e Paz nAquele que nos satisfaz em tudo!

Nasci em um lar evangélico, aprendi que nosso testemunho de cristão deve servir de luz para o mundo, que como crentes em Cristo Jesus não somos diferentes mas devemos fazer a diferença... Será que já estou sendo "evangélico"?

Mas a cada dia que passa entro mais em contradição, não com minha fé em Cristo Jesus, mas com as doutrinas impostas pelas "igrejas". Sou de uma igreja bem formal.

Sempre aprendi, e cresci com isso, que o crente deveria ser diferente, pois tem a luz de Cristo, e porque crente é o sal da terra.

Sei que já me entende...

Não gostaria de julgar as pessoas, as atitudes delas; mas cada dia que passo, vejo que a Igreja de Cristo tem-se confundido com as coisas do mundo.

Existem coisas que não consigo aceitar nem entender, como: "Boate evangélica; crente bebendo cerveja santa; festa junina santa; baile santo"... Hoje em dia tudo é permitido... Qual a diferença do povo de Deus?

Sou um jovem de 28 anos e não me enquadro no estereótipo "quadrado", mas será que a "igreja", "doutrina", conseguiram me fazer ser "quadrado"?

Será que eu deveria evoluir juntamente com as inovações propostas pelo mundo?

Obrigado pela atenção e amor dispensado.

Abraços,


Marcelo


Obs: Não poderia deixar de dizer o quanto teu site é abençoado.


NEle, em Quem a Graça é superabundante.


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Amigo e irmão Marcelo: Graça, Paz e Bem!

Leia Romanos 14 e você entenderá qual é a postura de um cristão frente coisas desse tipo. A leitura é tão simples que não farei comentário algum, pois sei que você entenderá.

Há, todavia, algumas coisas que gostaria de tratar com você, pois tenho algumas opiniões a lhe dar.

1o. Boate de crente, cerveja de crente, e tudo mais de crente e para crente, além de ser, em-si, algo careta e feio, é sintoma e manifestação de que os crentes não são o sal da terra, mas sim o sal dentro do saleiro. Ora, isto é reflexo daquilo que foi ensinado aos crentes: que o diabo mora na boate, que os demônios vivem no álcool e que o mundo é um lugar, não um espírito. Assim, quanto mais pensam que o mundo é feito de lugares, mais eles se tornam mundanos, visto que não vão aos lugares do mundo, mas criam seus “corbãs” (Mc 7:9-13) a fim de jeitosamente darem seus “jeitos” em relação àquilo que se diz ser mundano, mas que eles não vêem mal algum em fazer, tendo que fazê-lo dentro do aquário cristão, visto que para eles o mundo é um lugar, não um espírito. Assim, eles tornam mau, pela sua própria alienação e preconceito, algo que em si nem é bom e nem é mau, dependendo apenas de como cada um lida com a coisa em si.

2o. O mundo é um espírito, de acordo com Paulo. Ele chama de “curso deste mundo”, cuja tradução modernizada seria “o fluxo da corrente deste mundo”. Ora, esse espírito do mundo foi jeitosamente vinculado pelos evangélicos às coisas do lazer, do prazer, da diversão, dos relacionamentos, das festas, das boates, dos cigarros, das bebidas, das roupas e dos cosméticos. Assim, mesmo que uma pessoa que seja bondosa, sóbria, piedosa, misericordiosa, madura, limpa de olhos, sem inveja, não interessada em fofocas nem em disputas de espaço religioso, e plena de amor a Deus — ainda assim a tal pessoa será considerada mundana se tomar cerveja ou outra bebida alcoólica, se gostar de dançar, se fumar cigarro, se vestir-se bem e conforme gostos modernos e se não falar conforme a língua do gueto cristão. E isso é assim porque para os “evangélicos” o que contamina o homem é o que entra pela boca e não o que sai do coração. Ou seja: a maioria dos “evangélicos” são discípulos dos fariseus enquanto pensam que são discípulos de Jesus.

3o. No ensino da Palavra há “um mundo” ao qual se deve odiar e há “um mundo” ao qual se deve amar. O mundo que se deve odiar é feito de espíritos de maldade, inveja, corrupção, malícia, manipulação, ódio, raivas, iras, perseguições, antipatias, inafetividade, e objetização do próximo. Esse é mundo que se deve odiar, e que existe tanto na “igreja”, em seus concílios e em suas convenções, quanto em qualquer disputa política no Congresso Nacional. Já o mundo que se deve amar é feito de gente, de todo tipo de gente, e tem a ver com a celebração da vida, da alegria, da comunhão humana, da sociabilidade que aproxima os diferentes; visto que tal “mundo” é objeto do amor de Deus: a humanidade.

4o. Assim, em Jesus, o mundo existia muito mais no Sinédrio de Jerusalém do que na casa dos publicanos. Era em Jerusalém, a Jerusalém dos cultos ininterruptos, onde Jesus via o mundo; e é de lá que vêm os poderes acerca dos quais Jesus diz: “Vamo-nos daqui; pois aí vem o príncipe deste mundo” — embora quem chegue sejam as autoridades religiosas a fim de prendê-lO.

5o. Se o mundo, segundo Jesus, fosse festa, bebida, dança, etc, então, se deveria dizer que Jesus era um mundano, visto que Ele comia de tudo (a ponto de Lhe chamarem "glutão"), bebia de tudo (a ponto de ser designado como "bebedor de vinho"), andava com todos (a ponto se ser chamado "amigo de pecadores"), e não criava eventos para os pecadores, de um lado, e para os discípulos, de outro. Ao contrário, Ele levava os discípulos para a boate dos publicanos, para a festa dos pecadores, para os banquetes dos mundanos, do ponto de vista da religião.

6o. Jesus também não bebia cerveja ou vinho sem álcool. O vinho que Ele criou em Caná era vinho mesmo, como convinha ser em qualquer festa. Além disso, nos dias dEle, Joaquim Jeremias nos diz que a bebida mais comum era a "cevita", uma cerveja muito apreciada pelo mundo romano e por todas as pessoas da Palestina. Isso sem falar que o vinho da Ceia, segundo Paulo (I Co 11), tinha o poder de fazer embriagar ("...ao passo que há quem se embriague...”). Portanto, os cristãos originais não tinham essa neurose acerca de bebida alcoólica, até porque não dá para ser discípulo de Jesus e praticar essa forma de ascetismo —ou qualquer outra forma de ascetismo—, visto que Jesus era tudo, menos ascético; e o ensino de Paulo aos Colessenses é flagrantemente contrário ao ascetismo do tipo “... não bebas isto, não proves aquilo, não toques aquilo outro...”, coisas essas que Paulo diz que têm “aparência de sabedoria e humildade, mas que não têm valor algum contra a sensualidade”.
7o. O mundo que mais me apavora é esse mundo maligno que se disfarça de religião de Deus. É aí que as mais estranhas e malignas manifestações do mundo se manifestam, embora ninguém dance, beba ou fume. Sim, eles não fazem nada disso. Porém, devoram-se uns aos outros, conspiram contra os irmãos, torcem pela queda de alguns, alegram-se com suas vitórias filhas da malícia e vivem para garantir o cosmético de sua falsa humildade, as quais são os disfarces dos lobos que se vestem de ovelhas.

8o. Eu sou contra qualquer coisa "para crente", pois apenas aumenta o engano do ascetismo e exacerba a doença religiosa, a qual advoga que crente vota em crente, dança com crente, bebe bebida de crente, e vive num mundo paralelo. Ora, Jesus apenas pediu que estivéssemos no mundo, porém livres do mal. Para Jesus, fugir da vida era se tornar sal que perde o sabor, e que para nada mais presta, nem para o monturo.

9o. Eu vou a boate quando dá —infelizmente, hoje em dia, muito raramente. Mas quando vou, vou a uma boate de gente, onde eu possa dançar com minha mulher, e dançar músicas normais, conforme a poesia da vida. Quase não bebo, pois, depois de duas hepatites, meu fígado não gosta do impacto da bebida em meu organismo. Todavia, meu paladar gosta de um bom vinho, de uma cerveja geladinha num dia quente, de um “Porto” após as refeições, de uma caipirosca na praia, e de champanhe nas celebrações solenes.

10o. O que vejo é que pessoas para as quais esses mandamentos da etiqueta evangélica herdada dos missionários americanos —filhos do puritanismo anglo-saxão— são um problema, esses mesmos são os que mais se complicam na vida, posto que não sabem por que são obrigados a desgostar do que naturalmente gostam e por que têm que chamar de maligno aquilo que para eles não é nada. Assim, um dia essas pessoas explodem, e os resultados são desastrosos, posto que Paulo disse que o ascetismo não tem nenhum valor contra a sensualidade ou contra a embriaguez.



Ora, isto dito, quero afirmar mais o seguinte:


1o. Careta você é. Sim, um caretão evangélico. Explico: Você só me escreveu isso porque não gosta de ver boate de crente (nem eu), mas não consegue negar seu conflito e sua vontade de ser normal e poder gostar de tudo o que você gosta sem culpa, só que você não pode em razão das proibições dos fariseus que o discipularam.

2o. Você está se esforçando para ver “o mundo” nessas bobagens que foram criadas pelo próprio ascetismo evangélico e pela hipocrisia da religião, sempre tentando manter os crentes sob a tutela da “igreja”, e isso até na hora de dançar. E você faz isso da maneira mais “evangélica” possível, isto é, coando os mosquitos (as bobagens de crente que querem ser normais mas não têm permissão para isso; daí criarem esses “híbridos”), enquanto engole os camelos (o sistema de controle “evangélico”, com suas proibições, as quais condenariam como mundano o próprio Jesus).

O que se tem que saber é que uma pessoa que aparecesse fazendo o que Jesus fazia (curas, milagres e libertações) e dizendo o que Jesus dizia, se, todavia, vivesse com a liberdade que Ele tinha de comer e beber nas festas dos “mundanos” (publicanos e pecadores), tal pessoa seria vista pelos “evangélicos” do mesmo modo que os fariseus e religiosos viram Jesus em Seus dias.

Ou seja, o olhar dos “evangélicos” não vê a vida com os olhos de Jesus.

Ora, quem quer que não veja a vida com os olhos de Jesus, mesmo que seja cristão ascético, esse é mais mundano do que os “mundanos” que tal pessoa condena.

Minha sugestão a você é que esqueças as doutrinas de homens que lhe ensinaram, e que abra os evangelhos e as cartas de Paulo, e os leia com a mente mais virgem que você tiver; e, assim, depois me escreva, e me diga se sua mente não mudou completamente.

Eu teria muito mais a lhe dizer, especialmente quanto ao risco de você estar com raiva de não ter nem a cabeça boba dos que criam “boate para crentes” nem ter a liberdade para viver a vida conforme a sua consciência, visto que sei que você já não é quem um dia foi, porém ainda não teve a coragem de assumir sua própria consciência diante de Deus, pois teme transgredir os mandamentos dos anciãos.


Receba meu carinho e meu abraço!


Um beijão para você!


NEle, que comia e bebia com pecadores, e ia onde era convidado com boas intenções,




Caio

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

A PROPOSTA DE JESUS: A FALÊNCIA COMO ALÍVIO!



“Vinde a mim todos os cansados e os sobrecarregados, e eu vos aliviarei”, disse Jesus.

Ora, a salvação do cansado é Vir, não Ficar. A salvação do cansado é tomar algo, é atender um convite para sair de onde está e encontrar alívio para alma.

Mas como posso ir a algum lugar se eu mesmo não tenho forças para me ajudar?

Interessante isso. Para nós, a salvação do cansado é ficar e descansar. Jesus, no entanto, diz que o cansado tem que VIR.

Mas como o cansado andará se está cansado? Não seria muito mais digno de Deus dizer: “Todos vós cansados, ficai onde estais, e eu vos visitarei.”?

A questão é que Este que oferece o descanso está ao lado, e Seu convite não é um grito distante, mas uma súplica interior: “Vinde a mim... e achareis descanso. Tomai o jugo, e tereis alívio”.

Assim, o movimento, o Vir, não para fora, mas para dentro!

Todavia, por mais perto que Ele esteja, aquele que precisa da ajuda precisa Vir; tem de se movimentar; necessita escolher e acolher o refúgio.

Afinal, quem descansa no refúgio que não quer estar?

Refúgio forçado é prisão!

“Vinde a mim” é um convite pessoal e propõe um encontro pessoal. “Vinde a mim” equivale a “permaneça em mim, e você terá descanso”.

Todavia, nem por causa disso eu devo ficar onde estou. Eu preciso sair de onde estou em mim a fim de encontrá-lO como alívio para mim, ainda em mim.

“Permanecer nEle” é “Vir a Ele”. Portanto, é um permanecer em movimento, andando com Ele, deixando-se levar aos pastos verdejantes e às águas tranqüilas que não existem em nenhum éden terreno, mas tão-somente em paragens interiores.

“Vinde a mim todos...”, diz Jesus.

Que coisa mais linda é ouvi-lO dizer que Seu atendimento é pessoal, visto que só é para todos porque é para cada um.

Ele não pergunta pelo tipo de peso ou de carga que nos oprime; apenas aceita que pode ser qualquer coisa, e que Ele mesmo tratará com total pessoalidade qualquer que seja o jugo de agonias que possam estar afligindo a todos — portanto, a cada um individualmente.

Jesus, assim, não classifica angústias, e nem diz que certas agonias são virtuosas e, portanto, passíveis de ajuda, enquanto outras não são.

Jesus não age assim. Assim age a religião!

Não! Não é para um concurso de agonias que Ele nos convida, nem é para um vestibular de angústias, para, então, no fim, alguns serem selecionados para receber o alívio e a ajuda. Pois assim como Ele convida a todos, Ele também convida o tudo de todos, sem discriminação.

O critério que seleciona as agonias passíveis de socorro não obedece a nenhum juízo moral, ético ou religioso.

Quem pré-seleciona o candidato à ajuda é a Necessidade que faz com que o necessitado perca o senso de autocrítica e de auto-ajuda e simplesmente diga: “Eu não posso mais!”


Assim, o convite é para quem não pode mais; é para quem se cansou tanto que já desistiu, e só não desistiu totalmente porque não sabe como morrer.

Somente os que não sabem como morrer é que podem atender a tal convite, que num certo sentido só se consuma se eu digo: Morri, mesmo que ainda eu ainda exista!

O convite é para quem não sabe nem como morrer. Sim, o convite é, sobretudo, para estes.

“Vinde a mim todos vós”, diz Jesus. E, assim dizendo, Ele espera que “vós”, nós, eu, cada um, por si mesmo, decida aceitar a ajuda e Venha a Ele.

Estranho e fascinante. Eu não agüento mais, mas preciso “Vir a Ele”, o que significa fazer o movimento da rendição, da entrega total de toda autoconfiança.

O convite só se efetiva na completa certeza de que em mim mesmo não resta esperança.

O alívio só chega para quem já aprendeu que por si mesmo não chega a nenhum alívio por suas próprias pernas.

O alívio é apenas para os perdidos na impotência!

Maravilhoso e paradoxal!

Ele me diz: “Vem”. Mas eu não consigo dar nem mais um passo...

Assim, é na impossibilidade de me mover que eu me movo para onde está o refúgio.

Eu tenho apenas que dizer que não posso mais, e, no mesmo Instante, paradoxalmente, me movo para Ele, sem ter que sair de lugar nenhum, visto que o lugar sai de mim, pois a opressão é em mim, e o alívio está em mim, mas somente quando, em mim mesmo, Venho a Ele.

Quando eu desisto, vou a Ele. Então, descubro que o lugar do alívio não é um lugar, nem mesmo pode ser comparado ou medido como a distância de uma estrada a ser percorrida até chegar a Ele, onde está o descanso.

Não! É justamente por não poder ir que chego, e é por não agüentar mais que recebo o poder que me faz agüentar tudo.

“Tomai sobre vós o meu jugo, pois Sou manso e humilde de coração, e achareis descanso para as vossas almas, pois o meu jugo é suave e o meu fardo é leve”, explica Jesus.

Ele implora que eu aceite a ajuda dEle. Sim, Ele se mostra manso e humilde, e garante que o peso dEle é leve.

Peso leve. Jugo suave. Tudo isso vem da mansidão e da humildade dEle.

Aquele que me oferece ajuda é forte em Sua mansidão e humildade em Seu coração.

Que coisa linda!

Assim, aprendo que meu sacrifício quanto a receber o alívio é reconhecer que “não agüento mais”, e é “tomar um peso leve e um jugo suave”, que nada mais é do que aceitar a mansidão e a humildade de Deus como meu lugar de refúgio.
Sim, onde mais posso descansar senão na humildade de Deus?
Somente um Deus manso e humilde pode aceitar tudo em todos, e ajudar todos em tudo!

No entanto, eu tenho que “Vir”, fazendo o movimento na Permanência Nele, e que só acontece como impossibilidade de ir a qualquer outro “lugar” que não seja Ele.

Mas quem agüenta se entregar a um Deus tão manso e humilde? Quem aceita que o socorro implique em falência e desistência? Quem deseja para si trocar seu próprio jugo pelo de Outro, por mais que Este que me convide diga que seu peso não pesa?
Para receber o alívio do Deus manso e humilde requer-se do homem um ato de movimento e a coragem da troca. E pior: demanda desse carente que se declare mais que necessitado. Sim, dele se demanda que declare falência e que se movimente na declaração da impotência, e que seja humilde a fim de aceitar a falência como salvação.

Assim, a fim de me ajudar Jesus diz: “Venha”. E, assim fazendo, Ele me diz que a salvação é Ele, e que o caminho para ela reside na desistência de qualquer outra salvação que não seja um ato de reconhecimento da minha própria impotência e perdição.
Em Jesus somente os falidos são aliviados. Quem não chegou a esse ponto —onde já não se tem para onde ir— jamais saberá o significado de receber o alívio, visto que ainda é estivador de sua própria potência, e é ainda vítima de seu estado de não-falência assumida.

Bem-aventurados os sem forças para se mover, pois eles se moverão sem ter que ir a algum lugar, visto que o Lugar-Presença a eles vem. Aliás, implora para ser apenas reconhecido.



Caio

(Escrito em 12/06/2004)

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

O surf e a Deus me Livre



Visual do Cepilho em 1975: paraíso quase intocado na época. Foto: Bruno Alves.
  
Todo esporte, atividade, ou tudo que se faz na vida, tem seu Everest a ser conquistado, mais cedo ou mais tarde. Mas toda montanha carrega seus mistérios, perigos e agrouros também.

A ladeira Deus me Livre (trecho da estrada que dá acesso a Trindade) era assim há algum tempo.

Algo quase intransponível, ameaçador e traiçoeiro. Porém, ela levava direto ao paraíso intocável de Trindade, no extremo Sul do litoral fluminense.

Envolta neste misterioso clima, era a porta de acesso para a glória de desfrutar um local praticamente isolado da civilização.

Histórias de ondas enormes, pesadas e perfeitas debruçavam-se sob a encosta selvagem da Mata Atlântica, ou o calabouço da perda de um carro, ou quem sabe até a vida nos perigosos abismos em forma de lama que a circundavam.

A primeira vez que ouvi falar da Deus me Livre foi com meus surf brothers Bruno e Alberto Alves, verdadeiros Indiana Jones do surf brasileiro nos anos 70.

Histórias contadas no intervalo das aulas, no colégio Santo Américo, ou nos bastidores do edifício Bela Vista, no Guarujá (SP), alimentavam minha recém-formada alma de surfista. O medo e o temor impregnavam a aura das narrativas, aguçando minha curiosidade, mas impondo também um respeito proporcional.

Os dias se passaram. Já não me lembro ao certo quantos, mas chegara a hora de conquistar ou ver de perto meu então Everest, a Deus me Livre!

Em um feriado de Páscoa decidi ir até lá. Na época não tinha carro, nem previsões de clima e ondas na internet, apenas muita vontade e disposição de entrar no desconhecido, testar meus limites, enfrentar meus medos.

Assim fui com alguns amigos até a rodoviária partindo para Ubatuba e então outro busão até o trevo de Patrimônio. Ali era nosso acampamento base. Mas um de meus medos acabara de se materializar, uma chuva fina e constante escorria pelo calçamento. Iniciamos nossa caminhada por alguns íngremes e penosos quilômetros até o bifurcamento entre Trindade e Laranjeiras.

Iniciava-se minha jornada. Conforme íamos nos aproximando da descida, meu coração batia mais forte e a terra molhada fazia nossos pés deslizarem como skis na neve.

Incrível como na vida existem os ritos de passagem e seus misteriosos passos. Lembro-me tão nitidamente de um filme que assistia nas matinês no único cinema no centrinho do Guarujá: Horizonte Perdido! Cara, que impressionante a cena das pessoas sendo "congeladas" no tempo naquelas montanhas perdidas.

Ali, logo depois da Deus me Livre, nos aguardava um mundo cheio de surpresas e delícias, parado no tempo e espaço. Mas antes precisávamos cruzá-la, a linha real que adentrava no imaginário, materializando nossos sonhos da onda perfeita, virgem, intocável.

Quando me dei conta, estava defronte ao meu pequeno-grande Everest! Paramos para observar a ladeira sem fim, mais íngreme de tudo o que imaginava, intimidadora pelo próprio nome.

Quem eventualmente descia, sabia que teria a volta pela frente! Não acreditei quando vi um Volkswagen metros abaixo, engolido pela besta fera! Mas, aos poucos, passo a passo, fomos descendo por entre a névoa que se descortinava em um mar cinza e revolto, com sei lá quantos decibéis de estrondos.

A ponta do Cepilho era a mais pura e bruta energia tal qual tudo que nos rodeava. Ficamos ali, parados, olhando uns para os outros, mudos, perplexos diante de tão grande força. Podíamos sentir Deus na sua mais intensa expressão, tal qual um escalador deve senti-lo em seu cume.

Tivemos apenas o tempo de nos acomodarmos nos ranchos de pescadores à beira-mar e sem luz elétrica. A noite chegou como uma densa e abrupta escuridão.

Assim passamos nossa Páscoa em Trindade, conhecendo mais sobre seus moradores, suas histórias, suas poderosas ondas, sobre nossos medos, conquistas e sentimentos tão profundos, ou melhor, tão altos como os reais Everest que ao certo encontramos em nossa jornada pela vida.

Depois desta data aprendi algo que até hoje tem me ajudado e muito. Que, contrário ao nome da ladeira Deus me Livre, na vida é a permissão do próprio Deus em passar por estes aparentes obstáculos que me levaram para mais perto de mim mesmo e para mais perto Dele.

“Deus não me Livre”. Assim poderei ir mais longe, mais profundo, saindo da superficialidade da vida, crescendo e amadurecendo.



Por Motaury Porto em 15/02/11 01:25 GMT-03:00

Retirado de http://waves.terra.com.br/surf/noticia/o-surf-e-a-deus-me-livre/45464



sábado, 12 de fevereiro de 2011

Os bonzinhos e bem comportados são uma desgraça de coisa nenhuma



Soa como loucura hoje, no meio desses mega problemas, os quais envolvem tudo de tudo, do meio ambiente à perturbação da mente humana, pensar que um grupo de discípulos de Jesus pode ainda fazer qualquer sentido no mundo.

No entanto, se não fossemos judeu-evangélicos, sentindo-nos em relação ao Evangelho exatamente como alguns se sentiram em relação a ficarem em Jerusalém ao invés de irem ao mundo pregar a Palavra, existindo com a síndrome dos peixes de aquário, com complexo de passarinho de gaiola, sofrendo da sensação de produtividade de um ramister em roda de gaiola, contentes com a embaixada social da associação igreja, e dando banana para o mundo perdido, saberíamos que apesar de nossa fraqueza, incapacidade e inexpressividade, se fossemos às ruas, becos, encruzilhadas da terra, e todos os guetos, grupos e antros sociais, e apenas pregássemos, sem fixação em púlpitos, e sem crer que ministério só acontece dentro da “igreja” e de crente para crente, mas, muitos antes disso, como algo que acontece no caminho, e como resultado da paixão de cada um por Jesus, e isso feito em amor amigo e fraterno entre eles, geraria como resultado uma revolução simples, barata, poderosa, em cada canto da terra, e sem astros como atrações.

Se parássemos de ficar falando de Deus, estudando Deus, compreendendo Deus, defendendo Deus, trabalhando em escritórios de Deus, em entidades de Deus, em assembléias para tratar das coisas de Deus, sem comprar ou vender terreno para Deus, sem perder todo esse tempo “com Deus”, e, como o samaritano, sem agenda de sacerdote e levita, apenas fizéssemos o que tem de ser feito, e vivêssemos o fruto genuíno do Evangelho em nós, sem temor quanto a pregar, a orar com necessitados em qualquer lugar, até na sauna — então, subitamente veríamos que hoje mesmo, algo sem paralelos aconteceria na Terra.

Para isso também é fundamental parar de ficar explicando Deus para os religiosos assumidos e definidos. Pregar para cristãos de casca grossa não é cumprir a grande comissão de Mateus 28. É distração do inferno nos afastando para pregação a quem quer ouvir.

Provavelmente 95% da energia gasta pelos “cristãos” seja expendida em discussões entre “cristãos”. E no fim do dia a pessoa sente que se dedicou à obra de Deus. Tudo engano. São apenas os Templários modernos procurando o seu Santo Graal.



“Levanta. Toma teu leito, teu púlpito e tua algema de microfones, e anda enquanto é dia!”

Caio




 
 
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quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

E se Jesus voltasse!




Fala Galera,

Não sei quantos de vocês já ouviram alguém dizer algo do tipo: “E se Jesus voltasse nos nossos dias! Será que ele seria reconhecido pela galera que se diz cristão?”

Sinceramente tenho minhas dúvidas. Por mais que saibamos que Jesus Cristo, o filho de Deus viveu aqui na terra de forma simples, acredito que muitos esperam por uma volta triunfante. Muitos esperam um Cristo cheio de poder, reinando, julgando e condenando as pessoas que muitos denominam de “pecadores”, “hereges” e coisas do tipo. Esperamos por um Jesus que reine e que detone com todos os que não são “santos” e que use o seu poder para passarmos bem.

É como se esperássemos um Jesus que tivesse se rendido às tentações que sofreu por satanás no deserto. (Mateus 4:1-11)
E se ele viesse como um cara simples, que denunciasse a forma que os líderes têm vivido a custas da igreja e da fé das pessoas? E se ele mostrasse que o que move o coração das pessoas a estarem à frente de uma comunidade dita cristã seja o interesse financeiro e o desejo de controle do poder!

Olho para Jesus e não o vejo nos evangelhos controlando as pessoas, querendo dominá-las ao seu redor. Não vejo Jesus vendendo oração ou comercializando a fé das pessoas ao seu redor. Não vejo um Jesus que distribui carnês de fidelidade a sua comunidade para garantir seus sonhos egocêntricos.

Vejo um Jesus simples que não anda de carro do ano nem que possuí conta no exterior fruto da fé de pessoas simples que vivem honestamente suas vidas.

Vejo um Jesus que denuncia a hipocrisia dos “homens de Deus” da sua época. Pessoas que possuíam no fundo da alma desejos egocêntricos alimentados pela fé dos outros.

Se Jesus viesse em nossos dias acredito que ele seria expulso das igrejas. Ele incomodaria por ser simples e por querer somente amar e relacionar-se com as pessoas. Ele acabaria com o conforto do topo da pirâmide religiosa dos nossos tempos. Ele seria uma pessoa não desejada, pois sua simplicidade denunciaria o vício ao qual a maioria do mundo religioso está mergulhada.

O mundo evangélico fede e os mais ricos colocam perfume para disfarçar e podridão que há dentro de muitas comunidades religiosas.

Se Jesus voltasse acredito que não o encontraríamos nas igrejas evangélicas atuais, pois não seria aceito nelas. Acredito que encontraríamos Jesus no lugar por onde ele gostava de andar. Encontraríamos ele nas praias se relacionando com pessoas simples como os pescadores e os surfistas.


Boas Ondas.
 
 
 
 
 
Por: Carlos Bezerra
Retirado de: http://carlosbz.blogspot.com/2011/01/e-se-jesus-voltasse.html
 

A missão inclui todo ser vivo – uma reflexão sobre missão e ecologia





Durante milhares de anos, a missão para os cristãos resumia-se apenas a salvar homens. Aqui e ali se ouvia nas canções católicas, protestantes ou evangélicas alguma referência à natureza, mas apenas na perspectiva do louvor ao criador de todas as coisas.

Excelente obra deseja aquele que se empenha para comunicar Salvação aos homens!

No entanto, o que seria apenas um chamado de Deus ao homem para ser pescador de almas, com o passar do tempo, tornou-se a presunção da “igreja” entender-se como superior aos demais pecadores, passando a considerar quem “esteja fora ou dentro” como apto para o reino de Deus.

Igualmente, sua indiferença à natureza com a preocupação de preservar foi também mantida e, isto se deve a alguns fatores arraigados nas crenças e teologias. Eis alguns deles:

1. A ênfase no ser humano, como centro da criação.
2. Pela interpretação da vida eterna como sendo supressora da vida terrena.
3. A interpretação escatológica como invalidadora de qualquer cuidado com o planeta.


“No que diz respeito ao ser humano, embora ele tenha recebido habilidades excepcionais dos demais seres vivos, contudo, o Senhor o colocou num Jardim para que por ele- o homem- fosse regado e protegido.
Tudo começou em um jardim e tudo quanto significou alienação de Deus depois disso, sempre foi marcado pelo distanciamento do homem do ambiente natural, caminhando cada vez mais para a criação de cidades, de ajuntamentos, de torres, de centros urbanos, e de mundo, conforme o conhecemos”. Caio Fábio

Hoje, a humanidade encontra-se diante de realidades com as quais ela precisará adaptar-se, mesmo em face da inevitabilidade de algumas tragédias. Estamos vivendo um momento oportuno de sensibilizarmo-nos e ouvirmos os gemidos da criação.

Embora, a vida eterna seja irreferível se comparada à biodiversidade que nos cerca; e que o mundo inevitavelmente esteja inserido em sua continuidade escatológica, todavia, o discípulo de Jesus neste mundo, neste tempo, junta sua voz ao do Anjo do Apocalipse e dá glórias a Quem criou as fontes das águas; abraça todo ser vivo e chama de irmão; milita em toda boa causa que preserve – não como marketing ou mero ativismo-; mas firmado na premissa de que tudo o que Deus criou é bom, apesar de nós. E, se o Cordeiro foi morto antes da fundação do mundo, um parto amoroso para o nascimento de tudo o quanto existe, significa que toda a criação é produção do amor de Deus.

Você já parou para pensar que o mundo foi criado em amor? – esta é a mensagem da EcoGraça que deve ecoar no nosso eco (casa).

Sendo assim, seja também nossa missão, paralelo a nossa espécie, o preservar este planeta terra, nossa “casa comum”.
Como já disse o Carlos Bregantim: "O entendimento correto não poderia ser a terra criação do Altíssimo e nós os jardineiros, fazer dela um jardim?"




Em Cristo, em Quem toda terra é nossa, nós de Cristo e Cristo de Deus!

Fernando LimaSalvador/BA